Música e poesia

Não há nenhum lirismo em estar sozinha.Pois tem coisas que a poesia não resolve.
Eu quero estar alegre. Eu quero ganhar ibope.Música não resolve.


Não há mais para mim nenhum prazer numa fantasia.Não há platonismo que chegue.Não há poesia cantada que resolva.
Eu quero ser prático.Eu quero ser ético.
Vou me tornar uma moça certinha, daquelas que fazem e ninguém sabe.
Não há letra de música que resolva.Poesia escrita não é mais suficiente, nem se for cantada.


Vou arrumar um sub-emprego.Assim eu deixo de sonhar com a Índia.
Pretendo me conformar e fingir que não erro.Pois não há mais caminho de música e poesia.
Vou gastar meu salário com roupa e sapato e conseguir um namorado motorizado.Pois só me faz sofrer ouvir música e escrever.
Lirismo para que? Não se resolve o meu problema, não resolve.



Nunca mais vou me perguntar se o meu amado é o que está sentado no sofá da minha sala. Vou me conformar e me estereotipar.
Vou escovar o meu cabelo e aceitar a condição.Pois música e poesia faz agente pensar que pode.Mas nem o problema do negro essas duas resolvem.



Mas se me fizerem muita falta, vou escrever meu último poema preocupada com a métrica.Porque o amor não me ensina a gramática.Escrever certinho, isso sim, meu problema resolve.Mas música e poesia não me servem mais.Só alimentam a minha alma e me fazem idealista.Mas eu estou rica? Respondam! Estou rica?
Música e poesia.

Vou sossegar a minha paz e acordar na hora certa.Vou parar de entender a Bíblia e por um cabresto na minha cabeça.
Venderei minha liberdade e procurarei um analista.Tentarei mentir para ele e passar num exame de admissão.Quando conseguir o emprego deixarei de sonhar nas horas vagas.
Não vou discutir Platão, muito menos com o patrão.
"Minha filha sua poesia não resolve!Está demitida!" Vou evitar ouvir isso também.
Mas bem baixinho escuto: "Música e poesia."


Ai!Mas estou sentindo uma falta de ouvir umas notas.Nasce agora um desejo de sinfonia.
Me vejo numa casa, num campo, com um roqueiro rural. Casamento. Numa Atlândida perdida, uma fênix renasce das cinzas.O amor brota das pedras, das flores, dos galhos, dos beijos calados, susurros e arrepios.Um sonho velado por anjos de Deus.
Somos música e poesia.

De acordar do paraíso eu tenho preguiça, mas ouço o som de um carro e desisto.
" O senhor está certo. Música e poesia não resolvem."
Só pretendo tirar o analista da lista. Porque minha utopia nem Froid resolve.
Música e poesia.


E no meu coração palpita o peito.Como num segredo diz, "Para que resolver?Deixa viver!" Então sou só música e poesia que pode fingir ser outra coisa.
Resolve? Não, mas a letra brota das pedras, das flores, dos galhos, dos beijos calados, susurros e arrepios. Um sonho velado por anjos de Deus.
Lá fora um carro passa e eu não percebo mais.Porque todo o tempo vibra música e se lê poesia.